O relatório final da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da JBS foi aprovado, em votação simbólica – sem contagem de votos no painel eletrônico –, depois que o relator, deputado Carlos Marun (PMDB-MS), aceitou retirar pontos considerados polêmicos pelos integrantes da comissão.
Foram excluídos a sugestão de indiciamento do ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot; o projeto de lei que diminuía o poder do Ministério Público na celebração de acordos de delação premiada; e o pedido de investigação das denúncias feitas pelo advogado Rodrigo Tacla Durán contra a força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba (PR).
No texto original, Marun pedia o indiciamento de Janot e do procurador da República Eduardo Pellela (ex-chefe de gabinete de Janot) por prevaricação, abuso de autoridade e “incitação à subversão da ordem política”, crime previsto na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83).
Segundo o relator, Janot e Pellela sabiam das negociações relativas à colaboração premiada dos irmãos Joesley e Wesley Batista e da participação do ex-procurador Marcello Miller, acusado de favorecer os controladores do frigorífico JBS em troca de um contrato milionário com o escritório de advocacia que tratava do acordo de leniência do grupo.
Marun disse ainda esperar que a atuação da antiga cúpula do Ministério Público seja investigada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge. “Espero que ela dê continuidade às investigações”, afirmou o relator, para quem houve um complô para derrubar o presidente Michel Temer e impedir a nomeação de Dodge como sucessora de Janot.
O deputado Carlos Marun tomaria posse nesta tarde como ministro-chefe da Secretaria de Governo, no lugar do deputado Antonio Imbassahy (PSDB-BA), que retorna à Câmara. A solenidade foi adiada porque Temer se recupera de cirurgia urológica em um hospital de São Paulo.
Itens excluídos
Carlos Marun também retirou do texto, a pedido do deputado Delegado Francischini (SD-PR), a defesa de proposta (PL 7596/17, do Senado) que prevê o crime de abuso de autoridade por membros do Ministério Público e outras autoridades. “Este projeto é destinado a punir policiais e membros do Ministério Público”, disse Francischini.
Foi retirado ainda trecho do sub-relatório apresentado pelo deputado Wadih Damous (PT-RJ), que pedia a investigação das denúncias feitas pelo advogado Rodrigo Tacla Durán. “O depoimento do Tacla Duran é uma armação para incriminar o juiz Sérgio Moro”, disse o deputado João Gualberto (PSDB-BA).
Na CPMI, Tacla Durán questionou provas usadas pelo Ministério Público na Operação Lava Jato, alegando direcionamento nas delações premiadas. Disse ainda ter recebido a proposta de redução de multa, feita por um advogado de Curitiba que seria amigo de Moro, em troca do pagamento de R$ 5 milhões.
Damous lamentou a retirada das denúncias de Tacla Durán e acusou procuradores da Lava Jato de cometerem abusos. “O que Tacla Durán disse é de extrema gravidade, e espero que seja aberta investigação, com base nos documentos que a CPMI está enviando ao Ministério Público”, disse.
Para permitir a aprovação do texto, Marun já havia retirado proposta de Damous para regulamentar as delações premiadas. O projeto de lei pretende diminuir o poder do Ministério Público de oferecer redução de penas para os colaboradores, proíbe a celebração de acordos com acusados presos e obriga o registro em vídeo de todas as etapas da negociação.
Damous criticou também essa mudança. “As delações premiadas, hoje, permitem arbitrariedades do Ministério Público. São obtidas mediante coação. Apresentamos uma proposta detalhada e isso não está sendo aproveitado”, disse.
O relator manteve no relatório o pedido de indiciamento de Marcello Miller e dos irmãos Batista. Os controladores da JBS são acusados de corrupção ativa, uso indevido de informação privilegiada e manipulação de mercado. O executivo Ricardo Saud, da JBS, é acusado de corrupção ativa.
Recomendações
Ontem, Marun acrescentou ao relatório algumas propostas feitas pelos três relatores setoriais da CPMI – os deputados Hugo Leal (PSB-RJ), Damous e Francischini.
Hugo Leal apontou que o grupo que controla a empresa JBS foi beneficiado de maneira suspeita pela aprovação de uma lei (11.945/09), originada da Medida Provisória 451/08, que dispensava a exigência de certidão negativa de débitos para a obtenção de financiamentos de bancos oficiais.
Segundo o deputado, o texto original da MP dispensava por seis meses as exigências de regularidade fiscal para a obtenção de financiamentos concedidos por bancos públicos. No Congresso, a MP foi alterada, e o prazo foi estendido para 18 meses, o que, segundo Leal, coincide com a liberação de empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para o frigorífico.
No relatório, Leal pede a criação de uma outra CPI para investigar créditos tributários concedidos pelo governo a empesas dos setores agrícola e de proteína animal e lamenta que a comissão não teve tempo para avançar sobre os benefícios obtidos pela JBS junto aos bancos oficiais.
Ele também pede que o Ministério da Fazenda passe a divulgar a estimativa de renúncia tributária relativa a agroindústrias e sugere que o Tribunal de Contas da União tenha acesso a estes dados.
Marun manteve no texto proposta de decreto legislativo, sugerida por Damous, que susta os efeitos de decisão do Conselho Nacional do Ministério Público (Resolução CNMP 181/17) que, segundo o deputado, usurpa o poder de investigação da polícia e tira do Judiciário o poder de controlar o Ministério Público.
Comemoração
A votação do relatório final foi comemorada pelo presidente da CPMI, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO). Ele disse lamentar não ter havido tempo para ouvir nenhum dos políticos acusados de receber propina em troca de empréstimos oficiais à JBS e também criticou a atuação de alguns procuradores.
“Obtivemos provas de que o ex-procurador Marcello Miller e o procurador Ângelo Goulart Villela atuaram em benefício da JBS quando ainda eram da equipe de Rodrigo Janot. É difícil acreditar que o ex-procurador-geral da República não soubesse disso”, afirmou.
Os trabalhos da comissão foram criticados pelo deputado João Gualberto. “É triste o final da CPMI, que termina esvaziada. O tempo todo o objetivo foi de apenas perseguir o Ministério Público”, disse.
Artur Hugen, com Agência Câmara/Fotos: Vinícius Loures/ Cleia Viana/ Luis Macedo/AC
19 de Novembro, 2024 às 23:56