A aprovação de leis que desregulamentam o mercado de trabalho foi destaque durante o ano. Além do projeto de lei que permite o uso da terceirização em todas as áreas e da reforma trabalhista, onde passa a prevalecer o acordado sobre o legislado, a Câmara dos Deputados também aprovou projeto que estabelece a negociação coletiva no serviço público. Também foram aprovadas mudanças no Programa de Proteção ao Emprego (PPE) e no auxílio-doença, entre outros assuntos.
Terceirização
Em uma das votações mais polêmicas de 2017, o Plenário da Câmara aprovou o Projeto de Lei 4302/98, que permite o uso da terceirização em todas as áreas (atividade-fim e atividade-meio) das empresas. O texto, publicado como lei (13.429/17), também aumenta o tempo máximo do trabalho temporário de três meses para 180 dias, consecutivos ou não.
Quanto às obrigações trabalhistas, a nova lei estabelece a responsabilidade subsidiária da empresa contratante em relação à responsabilidade da empresa de serviços terceirizados pelas obrigações trabalhistas. Todas as mudanças ocorrem na Lei 6.019/74.
Na responsabilidade subsidiária, os bens da empresa contratante somente poderão ser penhorados pela Justiça se não houver mais bens da fornecedora de terceirizados para o pagamento da condenação relativa a direitos não pagos. Na solidária, isso pode ocorrer simultaneamente. Contratante e terceirizada respondem ao mesmo tempo com seus bens para o pagamento da causa trabalhista.
Já as obrigações previdenciárias deverão seguir a regra estipulada na Lei 8.212/91, que prevê o recolhimento de 11% da fatura de serviços de cessão de mão de obra a título de contribuição previdenciária patronal. Esse recolhimento é feito pela empresa contratante e descontado do valor a pagar à empresa de terceirização.
Será permitido ainda à empresa de terceirização subcontratar outras empresas para realizar serviços de contratação, remuneração e direção do trabalho a ser realizado por seus trabalhadores nas dependências da contratante. Esse artifício é apelidado de “quarteirização”.
Reforma trabalhista
Em longa votação, a Câmara aprovou a reforma trabalhista por meio do Projeto de Lei 6787/16, do Poder Executivo. O texto altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para prever, entre outras medidas, a prevalência do acordo sobre a lei, regras para o trabalho intermitente e o fim da contribuição sindical obrigatória e da ajuda do sindicato na rescisão trabalhista. A matéria foi transformada na Lei 13.467/17.
A proposta estabelece que a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho prevalecerão sobre a lei em 15 pontos diferentes, como jornada de trabalho, banco de horas anual, intervalo mínimo de alimentação de meia hora, teletrabalho, regime de sobreaviso e trabalho intermitente. Poderão ser negociados ainda o enquadramento do grau de insalubridade e a prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia do Ministério do Trabalho.
O texto determina que mudanças na duração do trabalho e nos intervalos de alimentação não serão consideradas como normas de saúde, higiene e de segurança do trabalho, proibidas de serem negociadas por acordo.
Além dessas normas, não poderão ser reduzidas ou suprimidas várias outras, como as garantidas pela Constituição e aquelas da CLT relativas a direitos de mulheres no ambiente de trabalho.
Acordos individualizados de livre negociação para empregados com instrução de nível superior e salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do INSS seguirão os mesmos itens do acordo coletivo que prevalece sobre a lei. Entretanto, o acerto individual prevalecerá sobre o coletivo.
Quanto ao trabalho intermitente, o texto o define como aquele no qual a prestação de serviços não é contínua, embora com subordinação, permitindo alternar períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador. Com três dias corridos de antecedência, o empregador convocará o trabalhador e informará a jornada. Se ele aceitar, terá um dia útil para responder e, se não comparecer, terá de pagar multa de 50% da remuneração que seria devida em um prazo de 30 dias, permitida a compensação em igual prazo.
Formas de trabalho já praticadas, como o teletrabalho, o regime de 12 x 36 horas e o de tempo parcial também foram disciplinados no projeto. Teletrabalho é definido como a prestação de serviços frequentemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação.
No caso do regime de 12 X 36 horas, o salário pactuado englobará os pagamentos devidos pelo descanso semanal remunerado e pelo descanso em feriados, que serão considerados compensados, assim como as prorrogações de trabalho noturno, quando houver.
Negociação no serviço público
Com a aprovação do Projeto de Lei 3831/15, do Senado, poderá ser regulamentada a negociação coletiva no serviço público das três esferas administrativas (União, estados e municípios). Aprovado em caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), o projeto foi vetado integralmente pelo presidente da República.
Atualmente, a negociação coletiva não é uma prática corrente no serviço público. O Executivo federal possui canais permanentes de negociação, mas sem previsão legal.
O PL 3831/15 abrange órgãos da administração direta e indireta (autarquias e fundações), de todos os poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), além do Ministério Público e da Defensoria Pública.
Segundo o texto, a negociação poderá tratar de todas as questões relacionadas ao mundo do trabalho, como plano de carreira, criação de cargos, salário, condições de trabalho, estabilidade, saúde e política de recursos humanos. A abrangência da negociação será definida livremente pelas duas partes. Poderá, por exemplo, envolver todos os servidores do estado ou município ou de apenas um órgão.
A participação na mesa de negociação será paritária. Se os servidores públicos não possuírem um sindicato específico, eles poderão ser representados por uma comissão de negociação, criada pela assembleia da categoria.
O texto aprovado prevê punição para os dois lados da mesa de negociação quando houver desinteresse em adotar as medidas acordadas. Para o representante de órgão público, esse tipo de conduta poderá ser enquadrado como infração disciplinar. Já os representantes dos empregados poderão ser multados em valor proporcional à condição econômica do sindicato.
Morador de rua
Vencedores de licitação para obras ou serviços da administração pública poderão ser obrigados a contratar moradores de rua, segundo prevê o Projeto de Lei 2470/07, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP), aprovado em caráter conclusivo pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. A matéria foi enviada ao Senado.
Caberá ao Executivo regulamentar os critérios para a contratação dos moradores de rua, mas a nova regra deverá constar nos editais.
Proteção ao emprego
As regras do Programa de Proteção ao Emprego (PPE) foram modificadas pela Medida Provisória 761/16, que permite a contratação de idosos, estagiários, pessoas com deficiência e ex-presidiários pelas empresas participantes do programa. A matéria foi convertida na Lei 13.456/17.
Com a nova lei muda também o nome do programa de PPE para Programa Seguro-Emprego (PSE). Ele é destinado às empresas em situação de dificuldade econômico-financeira que poderão reduzir salários e jornada de trabalho dos funcionários em acordo com os sindicatos.
O prazo de adesão ao programa foi prorrogado de dezembro de 2016 para dezembro de 2017. A previsão de sua extinção é prorrogada de 2017 para dezembro de 2018.
Para correção dos valores a restituir ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) pelas empresas que descumprirem o acordo coletivo ou as normas do PSE, a lei especifica que será usada a taxa Selic com capitalização simples mais 1% no último mês de atualização do débito.
O total a ser devolvido é a parte paga pelo governo para o trabalhador e as diferenças de encargo trabalhista e previdenciário, acrescidas de 100%. Se houver fraude, a multa será o dobro (200%).
O programa original foi criado pela Lei 13.189/15, que permite às empresas em dificuldade financeira reduzirem a remuneração e a jornada de trabalho de seus empregados em até 30%, contanto que não sejam demitidos sem justa causa durante o período de adesão.
Com recursos do FAT, o governo federal pagará até metade da parcela do salário que o trabalhador deixar de receber, limitada a 65% (R$ 1.068,00) do teto do seguro-desemprego (atualmente em R$ 1.643,72).
Auxílio-doença
Convertida na Lei 13.457/17, a Medida Provisória 767/17 aumenta as carências para concessão do auxílio-doença, da aposentadoria por invalidez e do salário-maternidade no caso de o segurado perder essa condição junto ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e retomá-la posteriormente.
O texto também cria um bônus para os médicos peritos do Instituto Nacional de Previdência Social (INSS) com o objetivo de diminuir o número de auxílios concedidos há mais de dois anos sem a revisão legal prevista para esse prazo.
A medida retoma o texto da Medida Provisória 739/16, que perdeu a vigência em novembro do ano passado. Até a edição da MP, a Lei 8.213/91exigia, do trabalhador que voltasse a ser segurado, o cumprimento de um terço da carência inicial para poder contar com as contribuições feitas antes de perder a condição de segurado e cumprir o prazo necessário à obtenção de novo benefício. Em 2005, no Governo Lula, uma tentativa de excluir essa regra foi rejeitada pelo Senado.
Assim, para receber novo auxílio-doença, por exemplo, cuja carência inicial é de 12 meses, o trabalhador que voltasse a ser segurado teria que contribuir por quatro meses para usar outras oito contribuições do passado e alcançar a carência. Com a MP, isso não é mais possível.
Segundo a nova lei, ele precisará contribuir por metade do tempo da carência inicial. No exemplo, seriam seis meses para poder pleitear esse benefício outra vez.
Contas do FGTS
Convertida na Lei 13.446/17, a Medida Provisória 763/16 permite o saque de contas inativas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) sem a carência de três anos exigida pela lei. A medida beneficia trabalhadores que pediram demissão até 31 de dezembro de 2015 ou que não tenham conseguido sacar os recursos da conta vinculada no caso de demissão por justa causa.
O trabalhador que tiver saldo em contas inativas do FGTS, aquelas em que não houver mais depósitos, poderá sacá-lo sem cumprir carência de três anos ininterruptos exigida em lei.
A exceção atinge contas inativas existentes em 31 de dezembro de 2015 e, principalmente, trabalhadores que pediram demissão ou não conseguiram apresentar a documentação no tempo hábil para sacar valores quando demitidos.
A partir da lei, também será aumentada a remuneração das contas individuais do fundo com a distribuição de 50% do resultado obtido no exercício financeiro pelo uso dos recursos no financiamento de programas de habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana.
O aumento da remuneração das contas do FGTS passaria, de acordo com cálculos do governo, dos atuais 3,7% ao ano para 5,5% ao ano.
Gorjeta
O rateio da gorjeta foi disciplinado com o Projeto de Lei 252/07, transformado na Lei 13.419/17. De acordo com a lei, a gorjeta cobrada por bares, restaurantes, hotéis, motéis e estabelecimentos similares não é receita própria dos empregadores e se destina aos trabalhadores, devendo ser distribuída segundo critérios de custeio e de rateio definidos em convenção ou acordo coletivo de trabalho.
Se não houver previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho, os critérios deverão ser definidos em assembleia geral dos trabalhadores. Entretanto, limites são definidos pelo projeto.
As empresas que participem de regime de tributação federal diferenciado, como o Simples Nacional, deverão lançar a gorjeta na nota fiscal de consumo e poderão reter até 20% de sua arrecadação, conforme previsto em convenção ou acordo coletivo, para pagar os encargos sociais, previdenciários e trabalhistas derivados da sua integração à remuneração dos empregados. O valor restante deve ser revertido integralmente em favor do trabalhador.
No caso das empresas não inscritas em regime de tributação federal diferenciado, poderão reter até 33% do arrecadado com gorjetas, seguindo as demais regras: lançamento na nota e rateio entre os empregados do restante.
Desde que cobrada por mais de doze meses, a gorjeta será incorporada ao salário do empregado se a empresa parar de cobrá-la, salvo o estabelecido em convenção ou acordo coletivo de trabalho.
19 de Novembro, 2024 às 23:56