Até o fim deste mês está em consulta pública um novo pacote de medidas de combate à corrupção, elaborado pela organização Transparência Internacional, em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV). As medidas são baseadas na experiência de enfrentamento à corrupção em 100 países e podem ser consultadas através da plataforma Wikilegis.
Considerado pela Transparência Internacional, organização que divulga anualmente o Índice de Percepção de Corrupção, como o maior pacote de corrupção do mundo, o novo conjunto de medidas tem mais de 80 sugestões de proposições legislativas, como emendas constitucionais e projetos de lei.
Entre os temas colocados em debate estão a redução do foro privilegiado e criminalização do chamado caixa 2, além da criação de um Sistema Nacional de Combate à Corrupção e Controle Social e de facilitadores para a participação popular no processo de produção de leis.
Também estão sob consulta a regulamentação do lobby, a possibilidade de aplicação da Lei da Ficha Limpa para servidores públicos, autorização da prisão preventiva de parlamentares, criminalização do enriquecimento ilícito de agentes públicos, definição dos crimes de abuso de autoridade e estabelecimento de condições para regular a circulação de dinheiro em espécie.
O público também poderá opinar sobre a proposta de estabelecer um teto para o autofinanciamento em campanhas e sobre a extinção do novo fundo de financiamento eleitoral.
Pelas propostas em consulta, os partidos políticos poderão ser mais responsabilizados ao serem submetidos à legislação que trata de lavagem de dinheiro e na que determina transparência no acesso à informação, por exemplo.
Outros pontos como a proteção de denunciantes de boa fé, definição de corrupção privada como crime, maior transparência na seleção de ministros dos tribunais de contas e a criação de um gatilho de eficiência para garantir duração razoável do processo judiciário também foram incluídos entre as medidas.
A apresentação das novas medidas dá continuidade de forma mais ampliada à mobilização iniciada há três anos com a coleta de mais de dois milhões de assinaturas em favor da proposta de iniciativa popular com 10 medidas anticorrupção. O chamado pacote das dez medidas, então elaborado pelo Ministério Público Federal, foi apresentado ao Congresso Nacional em março de 2016.
Ainda naquele ano, na madrugada de um dia conturbado, o plenário da Câmara aprovou o projeto. Contudo, os deputados retiraram do texto as principais mudanças previstas na proposta original, fato que motivou a reação de várias instituições.
O novo pacote começou a ser elaborado há mais de um ano com apoio de mais de 300 instituições e apresenta medidas consideradas mais prioritárias por especialistas nas áreas de prevenção e repressão à corrupção. Alguns dos temas criticados pela sociedade no pacote anterior foram removidos e outras abordagens incluídas, principalmente com foco na transparência e controle social.
Segundo as instituições envolvidas na organização da consulta pública, a nova agenda pretende ampliar a discussão para além das questões circunstanciais da política e apresentar soluções estruturais para um problema sistêmico.
“Esse nosso projeto abre esse espaço de construção coletiva de ideias e projetos de lei. A gente tem quase 100 especialistas envolvidos, sem contar todos os outros indivíduos que vão contribuir na plataforma. Então, é um projeto de construção coletiva de uma agenda muito importante para o país que a agenda da anticorrupção”, disse Michael Freitas Mohallem, professor da Fundação Getúlio Vargas/Direito Rio e coordenador do Centro de Justiça e Sociedade.
Segundo o representante da Transparência Internacional no Brasil, Bruno Brandão, o pacote tem maior envergadura que o anterior devido ao momento histórico que o país tem vivido. E um dos principais objetivos da iniciativa é incluir os temas do pacote no debate eleitoral deste ano.
“Se tem um momento para ser ambicioso, para o país ter a ambição de mudar de patamar, de transformação qualitativa no combate e controle da corrupção, se existe um momento para ser ambicioso é agora, e talvez o último em algum tempo. Já existe uma fadiga, uma descrença, uma divisão do país, então, [a corrupção] ainda é o tema número um do debate público”, disse Brandão.
Passada a etapa de consulta pública, a estratégia da organização é apresentar o pacote para candidatos e tentar angariar o apoio deles para a apresentação das propostas no Congresso Nacional a partir de 2019.
“O foco é a adesão dos candidatos assinando um compromisso com esse pacote, para que ele seja colocado em votação já no início da próxima legislatura, em 2019. Então, os candidatos para a Câmara dos Deputados e o Senado Federal, nós vamos buscar um a um e fazer um trabalho de convencimento e advocacy [prática política desenvolvida por indivíduo, organização ou grupo de pressão, no interior das instituições do sistema político, com a finalidade influenciar a formulação de políticas e a alocação de recursos públicos] para que possam aderir ao pacote”, explica.
Brandão esclarece que o candidato poderá apresentar ressalvas ao pacote, mas a ideia é encontrar entre os aspirantes a um cargo no parlamento defensores que se manifestem publicamente em favor de mudanças na legislação de combate à corrupção no país. Os eleitores também serão alvo de campanhas de estímulo ao debate das questões propostas.
Uma das organizações que participarão da mobilização dos candidatos e dos eleitores é o Instituto Mude, que tem disponibilizado cursos online de cidadania para formar potenciais multiplicadores dos temas contidos nas medidas. O objetivo é promover a discussão do tema no dia a dia e orientar os eleitores sobre candidatos investigados por envolvimento em irregularidades.
“ Trabalhamos nas dez medidas, entendemos que foi um passo e que a sociedade aprendeu com o processo como um todo. Agora, essa oportunidade de novas medidas é uma nova esperança, uma nova possibilidade. [O período eleitoral] é um momento propício porque é uma oportunidade que a população está aberta para o tema corrupção. As pessoas querem saber, querem se informar e cobrar. Tomara que no processo de voto sejam consideradas de fato essas questões mais objetivas de combate à corrupção”, ressalta Patrícia Alves, uma das porta-vozes do Instituto Mude.
A consulta pública ficará aberta até 30 de abril, seguinda-feira próxima.
Artur Hugen, com Agência Brasil/Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
19 de Novembro, 2024 às 23:56