Imagine você dono de uma empresa com patrimônio líquido negativo de R$ 1,2 bilhão. Com passivo trabalhista de R$ 793 milhões, sendo que, na última década, você já pagou R$ 1,4 bilhão. E a cada 60 dias, você tem que renegociar o ICMS de R$ 100 milhões por mês para não cair na dívida ativa da Receita Estadual.
Isso não é real, você vai dizer. Sim, esta é a situação da Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica (CEEE-D), e o dono é você, que sustenta o acionista majoritário desta empresa com seus impostos: o Estado do Rio Grande do Sul. Para 34% dos gaúchos, que moram nos 72 municípios atendidos com a energia elétrica da CEEE-D, a conta é dobrada.
O dono da CEEE-D, o Estado do Rio Grande do Sul, precisa aportar recursos superiores a R$ 2 bilhões até 2020 para não perder o maior patrimônio da companhia: a concessão. Investir esse montante seria possível desde que se vivesse em um estado com capacidade para aplicar o necessário em educação, saúde, segurança. E onde o prestador de serviços à população, o servidor público, recebesse o salário integral em dia.
Então, esta é a pergunta que está na mesa: o que você faria com esta empresa se fosse o dono? O governo do Estado solicitou, pela segunda vez, à Assembleia Legislativa autorização para realização de plebiscito sobre a privatização ou federalização do Grupo CEEE e de mais duas estatais da área de energia - a Companhia de Gás do Estado do Rio Grande do Sul (Sulgás) e a Companhia Riograndense de Mineração (CRM). A consulta é proposta para que você decida se o Estado deve seguir dono dessas companhias.
A questão aqui não é só o fato de o Estado deixar de ser o dono dessas empresas. Vai muito mais além. No caso da CEEE, passa pela qualidade da luz que você tem em casa. E o mais importante: onde deve ser aplicado o imposto que você paga? O Estado deve seguir mantendo uma empresa quebrada e não tendo dinheiro para investir mais em educação, saúde, segurança, infraestrutura e proteção social?
"Queremos ouvir a população, para que ela decida, democraticamente, sobre o destino das três empresas. Não posso imaginar que alguém não queira que a população seja ouvida", sustenta o governador José Ivo Sartori em referência ao pedido de aprovação do plebiscito pela Assembleia Legislativa.
Privatizar ou federalizar a CEEE não se trata simplesmente da vontade do governo. É uma questão de gestão. "Em 2017, estivemos à beira de perder a concessão. Devemos iniciar a venda de parte do patrimônio da empresa para obter receita? Uma saída é a privatização ou a federalização. Isso porque a CEEE, assim com a Sulgás e a CRM, são empresas que integram um setor extremamente estratégico para o país e o mundo, que se transformou em insumo básico de competitividade. Portanto, são empresas que podem despertar o interesse de investidores. Geridas pela iniciativa privada, elas poderão crescer e se expandir", afirma a secretária de Minas e Energia, Susana Kakuta.
A CEEE é formada pela CEEE Geração e Transmissão, que tem resultado positivo, e a CEEE Distribuição, que tem dado prejuízos sequenciais. "Mas quando se fala em privatizar ou federalizar a CEEE, falamos no bloco inteiro, para buscar o equilíbrio e para que se tenha o interesse do setor privado em absorver a empresa", esclarece a secretária.
Plebiscito: longo caminho
A tentativa do governo de consultar a população sobre o tamanho do Estado que os gaúchos querem vem desde 2015, quando foi encaminhado à Assembleia Legislativa o projeto de extinção da Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa).
Com o agravamento da pior crise financeira já enfrentada pelo Rio Grande do Sul em 2016 e a necessidade de medidas urgentes, o Executivo encaminhou ao Legislativo o Plano de Modernização do Estado. No documento, constavam as propostas de emendas constitucionais (PECs) que pediam a retirada da CEEE, CRM e Sulgás da lista de empresas que precisavam ser objeto de plebiscito para alienação. O pedido não avançou.
Honrando compromisso assumido, o governador Sartori encaminhou então, em maio de 2017, pedido para realização de plebiscito para decisão sobre as estatais, que foi arquivado pela Assembleia. Em seguida ao arquivamento, 19 deputados entraram com nova solicitação de plebiscito. O presidente do Legislativo remeteu para a Comissão de Constituição e Justiça, onde o pedido acabou sendo inviabilizado e arquivado.
Precisando de soluções urgentes para as empresas, o governo enviou novas PECs, tendo em vista a convocação extraordinária da Assembleia em janeiro deste ano. Novamente, a oposição inviabilizou o avanço do tema. Em paralelo a isso, o governo já elaborava novo projeto de plebiscito, encaminhado novamente em abril deste ano à Assembleia Legislativa.
Dúvidas
Se você ainda tem dúvidas, confira o Perguntas e Respostas, elaborado para esclarecer a situação das três estatais do setor de energia e por que é necessário um plebiscito para decidir se as empresas devem seguir públicas ou não.
Artur Hugen, com Secom/GRS/Fotos: Luiz Chaves/Palácio Piratini/Arquivo/Palácio Piratini
19 de Novembro, 2024 às 23:56