Mais de uma dezena de jornalistas, em pelo menos oito estados brasileiros, sofreram ameaças e agressões verbais durante o trabalho de cobertura da greve dos caminhoneiros, desde o dia 21 de maio de 2018. Houve relatos de casos na Bahia, Ceará, Londrina, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) e os Sindicatos filiados denunciaram as agressões e pediram providências às autoridades de Segurança Pública.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado da Bahia protestou contra a agressão verbal sofrida pela equipe da TV Subaé, formada pela jornalista Poliana Rodrigues, pelo repórter cinematográfico Leonel Alves e pelo operador Silvério Segundo, quando faziam matéria jornalística sobre a paralisação dos caminhoneiros na região de Feira de Santana, bairro Cidade Nova. Os profissionais foram agredidos verbalmente por populares de identidades não informadas que, supostamente, faziam parte das manifestações.
“Essa agressão a integrantes da imprensa é um grave sintoma da violência que permeia a sociedade por atingir pessoas que são responsáveis por dar voz aos problemas desta mesma sociedade. O Sinjorba solicita o imprescindível apoio da Secretaria de Segurança Pública da Bahia para que providências sejam tomadas e o profissional de imprensa possa desempenhar seu trabalho com liberdade e respeito ao público conforme rege a Lei”, disse a diretora regional do Sindicato da Bahia, Marly Caldas.
Equipes da TV Verdes Mares, do Ceará, foram hostilizadas nos últimos dias. Duas delas foram impedidas de trabalhar. Alessandro Torres, Alana Araújo, Aline Oliveira e o repórter cinematográfico Souza foram os profissionais que sofreram as agressões. Mais duas equipes de TV foram insultadas pelo movimento dos caminhoneiros. Os repórteres João Albuquerque, da TV Cidade, e Miguel Anderson Costa, da TV União, além do repórter cinematográfico Matheus Sousa, também da TV União, formam o segundo grupo intimidado. A reportagem do jornal O Povo também foi vítima das ilações dos participantes do protesto. Germana Pinheiro e Matheus Facundo Araújo foram alvo de insultos.
Diante dos fatos, a diretoria do Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado do Ceará (Sindjorce) entrou em contato com as organizações representantes dos caminhoneiros para que orientem os grevistas a respeitar o trabalho dos jornalistas. Também se coloca à disposição dos jornalistas para receber denúncias e buscar formas de garantir a segurança dos profissionais. O Sindjorce reitera que cobra há cinco anos a instituição de um protocolo de segurança para jornalistas, a ser pactuado entre sindicato laboral, empresas de comunicação e o Governo do Estado do Ceará. No entanto, os donos da mídia têm se negado a avançar neste sentido.
Em Pernambuco, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais (Sinjope) repudiou as agressões a profissionais da imprensa em seu exercício profissional. As ações foram registradas nos dias 24 e 25 de maio, quando profissionais da TV Globo foram vítimas de atos covardes, um deles diante de PMs que se omitiram em vez de garantir o trabalho da imprensa. A direção do Sinjope também cita casos no interior de Pernambuco, onde houve ameaça e imposição para destruição de imagens.
Censura
A censura no Diário de Pernambuco também foi denunciada pelo Sinjope e FENAJ. De acordo com o Sindicato, profissionais do jornal realizaram uma cobertura isenta sobre a greve e protestos de caminhoneiros contra a alta do preço do óleo diesel. No entanto, a manchete do Diário incorporou um foco hostil aos caminhoneiros. Profissionais e estagiários que trabalham no jornal pediram uma retratação para a manchete “desastrosa” que não condizia com o conteúdo da edição. Segundo eles, o conteúdo apurado não correspondeu ao que expressou a manchete, evidenciando uma clara distorção do enquadramento das matérias pela direção da empresa. “O Sinjope e a FENAJ acolhem e reverberam o protesto desses profissionais e conclamam a direção do Diário de Pernambuco e das demais empresas a respeitarem o trabalho de cada profissional”, diz a nota do Sindicato.
O presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Norte do Paraná, Danilo Marconi, foi ao 6º Distrito Policial de Londrina, no dia 28 de maio, registrar boletim de ocorrência devido às ameaças aos jornalistas durante o movimento dos caminhoneiros. São pelo menos quatro casos em Londrina e dois em Maringá. Em um dos episódios, manifestantes ameaçaram atirar de um viaduto um repórter da RPC caso ele dissesse algo considerado negativo pelo movimento. Já uma equipe da RIC TV teve o carro cercado por um grupo com barras de ferro. No domingo (27), manifestantes também cercaram a sede da RPC Londrina proferindo ofensas aos funcionários.
O Sindicato dos Jornalistas recomenda que os próprios profissionais vítimas de ameaças e/ou agressões registrem queixa e representem contra os autores. O assessor jurídico do sindicato, Davidson Santiago Tavares, diz que é necessário haver representação da vítima para que os órgãos competentes abram inquérito e entrem com ação penal. O prazo para representação é de seis meses.
O Sindicato do Estado do Pará recebeu relatos de casos de dois jornalistas (um repórter e um repórter fotográfico) do jornal O Liberal que foram hostilizados na cobertura da greve dos caminhoneiros no município de Benevides, Região Metropolitana de Belém. Sob xingamentos, foram acusados de estarem a serviço do governo. No Rio Grande do Sul, jornalistas da RBS TV também sofreram agressão verbal.
Uma equipe do jornal O Globo foi ameaçada na manhã de sábado (26) em frente à Refinaria Duque de Caxias (Reduc). Uma repórter, um fotógrafo e um motorista do jornal foram abordados durante o trabalho e tiveram de sair às pressas do local depois de dois homens terem mostrado um artefato que parecia ser uma granada. Por volta das 6h, quando passava de carro perto o centro de distribuição da Shell, em marcha lenta e com logotipo do jornal à mostra, a equipe percebeu uma aglomeração de caminhoneiros no local. Dois homens se aproximaram. Um deles, que tinha o rosto encoberto, desferiu dois socos na porta do motorista e gritou para que a equipe saísse dali. A equipe decidiu estacionar em outro ponto da via, próximo a uma viatura da PM.
Os policiais, contudo, tiveram de sair depois que alguns caminhoneiros começaram a disparar rojões na direção da refinaria. Foi então que dois homens ameaçaram atear fogo nos carros do jornal e da TV Globo, que também tinha uma equipe de jornalistas no local. Em seguida, o homem tirou um artefato semelhante a uma granada do bolso e mostrou-o ao motorista. Por segurança, a equipe decidiu abandonar o local e registrar a ocorrência.
Em Santa Catarina, o jornalista Arnaldo Zimmermann foi vítima de intimidação, ameaça e teve seu celular derrubado com um tapa, desferido por um dos agressores. Ele fazia uma transmissão ao vivo, de Indaial, quedado foi interrompido por um caminhoneiro, que questionou se ele tinha autorização para gravar. Outros manifestantes se aproximaram e começaram a intimidá-lo, até que um deles derrubou o celular do profissional. A Sindicato de Jornalistas de Santa Catarina e a FENAJ repudiaram a agressão e, em nota pública, também manifestaram-se contra a política de preços dos combustíveis praticada pelo governo federal e Petrobras.
Defesa intransigente
A Federação Nacional dos Jornalistas e os 31 Sindicatos filiados conclamam aos profissionais vítimas a registrarem tais ocorrências e a buscar apoio nos Sindicatos de Jornalistas. Relatório da Violência contra os Jornalistas, produzido pela FENAJ, edição de 2017, mostrou que foram registrados 99 casos agressões contra jornalistas, 38,51% a menos do que em 2016, quando houve 161 agressões. Neste ano, um jornalista e um radialista foram assassinados e já acorreram mais de 50 casos de agressões.
A FENAJ e os Sindicatos de Jornalistas brasileiros salientam que agressões verbais e/ou físicas devem ser veementemente apuradas e condenadas, inclusive como objeto de processos criminais, além de constituírem atentado à liberdade de informação, de imprensa e, portanto, uma afronta a princípios basilares da democracia. “Defendemos intransigentemente o jornalista no exercício profissional”, diz a presidenta Maria José Braga.
Artur Hugen, com Fenaj/ Foto: Átila Alberto
19 de Novembro, 2024 às 23:56