Chega para análise do Senado o novo Marco Regulatório do Transporte Rodoviário de Cargas, um dos pleitos dos caminhoneiros que ficaram 11 dias em greve no mês de maio. A aprovação do projeto (PL 1.428/1999 na Câmara dos Deputados) faz parte do acordo do governo com o setor para o fim da paralisação. A proposta chega à Casa na forma do substitutivo do deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), aprovado na quarta-feira (20) na Câmara. O texto ainda está sem número no Senado.
Com 91 artigos, o marco regulatório estabelece regras de segurança nas estradas, infrações e condições de contratação de transportadores, como pagamento, seguros e vale-pedágio. As determinações valem para caminhoneiros autônomos, empresas de operação logística, transportadores de carga própria, cooperativas e empresas transportadoras de cargas e de valores, que ficam divididos de acordo com o número de veículos de carga e a capacidade de transporte em toneladas.
Para o senador Paulo Paim (PT-RS), a proposta tem chances de ser aprovada até o recesso parlamentar, por ser parte de um acordo coletivo a partir da greve dos caminhoneiros.
— Não é uma questão de situação ou de oposição, é um acordo que foi firmado. O Congresso tem que assumir a responsabilidade de votar essa matéria já na semana que vem — disse.
Já a senadora Simone Tebet (MDB-MS)
S) aposta em um período maior de discussão da matéria, visto o tamanho e a abrangência do projeto. A líder do MDB considera o marco regulatório relevante e necessário para o setor, porém acredita que ele deve ser analisado com cautela, principalmente no que se refere às relações contratuais. Dependendo do encaminhamento da proposta e da avaliação positiva dos senadores, Simone também não desconsidera apresentar um pedido de urgência para adiantar a votação.
— São muitas questões, nós nunca tivemos um marco regulatório. Às vezes trinta dias a mais [de discussão] significa ter um marco regulatório eficiente e eficaz. O que não dá é para aprovar sem consenso – afirmou.
O presidente do Senado, Eunício Oliveira, afirmou que até a aprovação do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLN 2/2018), o Congresso estará aberto, logo, com possibilidade de votação da proposta sobre transporte rodoviário de cargas. Ele assegurou que a Casa cumprirá o acordado entre a categoria e o Congresso.
Uma das principais determinações do marco é a criação do Documento Eletrônico de Transporte (DT-e) para facilitar o controle e fiscalização do tráfico de cargas. A forma de registro e o conteúdo do DT-e serão regulamentados pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que terá autorização para compartilhar as informações do documento com as Fazendas públicas. O registro será obrigatório e também valerá para os Correios.
O projeto cria ainda Comissão Permanente do Transporte Rodoviário de Cargas (CP-TRC), que terá a finalidade de melhorar o setor por meio de estudos técnicos. De caráter consultivo para suporte ao governo, o colegiado será coordenado pelo Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil e terá como uma das responsabilidades a elaboração e atualização constante de planilhas de custo de orientação por área de transporte.
O pleito dos caminhoneiros pela dispensa do pagamento do pedágio sobre os eixos suspensos dos caminhões, já previsto na MP 833/2018, foi contemplado também no marco regulatório. Segundo o projeto, os veículos de trans
porte de cargas que circularem vazios ficarão isentos, em todo o território nacional, da cobrança de pedágio sobre os eixos que mantiverem suspensos.
O vale-pedágio obrigatório, também já previsto na legislação, foi incluído no marco com alterações. O pagamento, feito por quem contrata o transportador, deverá ser realizado por meio eletrônico definido em regulamento da ANTT. É vedado o pagamento em espécie. A penalidade para quem não pagar, que antes era multa de R$ 550 por veículo, passou a ser duas vezes o valor do frete da viagem em que se deu a irregularidade de pagamento.
Em casos de subcontratação, quando um transportador contrata outro para um serviço, o transportador subcontratante é responsável secundário pelo pagamento do pedágio. O projeto define inclusive que a subcontratação de serviços de transporte é sempre uma relação empresarial e comercial, ainda que seja entre uma pessoa física e uma empresa. Logo, não há vínculo empregatício ou relação de trabalho.
Em relação às subcontratações, os contratos definirão a forma de prestação de serviço do subcontratante: ou como agregado, quando o serviço é periódico e com remuneração certa, ou como independente quando o serviço é prestado sem exclusividade e com ajustes de remuneração a cada viagem.
Já quando não previsto em contrato, de modo geral, o tempo de serviço de transporte terá duração mínima de 24 meses ou, se o serviço necessitar a compra de equipamento específico, de 48 meses. Para o transporte de insumos e produtos agrícolas serão admitidos prazos menores de acordo com a sazonalidade das culturas. O projeto permite também a celebração de acordos individuais ou coletivos, entre contratante e motorista, com validade sujeita ao reconhecimento dos sindicatos das categorias envolvidas.
O marco regulatório define ainda como competência da Justiça comum o julgamento de ações relativas a contratos de transporte de cargas. O texto cria, contudo, o Centro de Conciliação do Transporte (Cecont) para atuar na resolução de conflitos do setor. O centro funcionará nos termos da Lei da Arbitragem (Lei 9.307/1996) sob a coordenação das entidades sindicais de transportadoras e de transportadores autônomos.
O texto estabelece que o frete seja pago na entrega da carga por meio de depósito em conta de titularidade do transportador. O atraso implica multa de 10% e juros de mora de 1% ao mês mais correção monetária. As movimentações na conta, no caso dos caminhoneiros autônomos, servirão de comprovante de renda.
Além do pagamento do frete, no momento da entrega o transportador deverá estar atento ao período máximo de 5h de espera para a carga e descarga. A espera adicional passa a representar R$1,61 por tonelada/hora ou fração, considerando a capacidade total do veículo.
Os contratos de frete deverão conter novas seguridades obrigatórias. Transportadores de todas as categorias deverão ter um seguro para cobertura de danos causados a terceiros. Cooperativas e empresas transportadores e de operação logística necessitam ainda ter seguros contra roubo, furto ou assalto e danos à carga. As condições dos seguros devem obedecer a legislação em vigor (Lei 12.529/2011), que pune os contratantes que impuserem aos transportadores a contratação de seguradoras específicas.
Há ainda no projeto a previsão de que as partes possam estabelecer, em comum acordo, planos de gerenciamento de risco (PGR), que poderão futuramente ser regulamentados pela ANTT.
Além da previsão do seguro contra roubo e danos à carga, será criado o agravante para o crime de roubo se a vítima estiver em serviço de transporte rodoviário de cargas. A previsão já existe no Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940), mas vale apenas para o roubo de transporte de valores. Pelo projeto, o aumento de dois terços da pena de 4 a 10 anos de reclusão também incluirá o roubo de cargas.
O crime de receptação também terá agravante de pena: receber, repassar ou revender carga ou valores roubados passa a implicar pena de 3 a 8 anos de reclusão, com perda por 10 anos do CNPJ, no caso de empresas. O transportador, de qualquer categoria, se comprovada a participação no crime de receptação ou desvio de carga, terá o Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Carga (RNTRC) suspenso por 10 anos.
Motoristas contratados por empresas transportadoras, com participação comprovada, perdem o cadastro único frente a ANTT e o direito de exercer atividade remunerada por meio do veículo. Já as empresas transportadoras que lidarem com bens objeto de descaminho, contrabando, falsificação, roubo, furto ou receptação, terão suspensa sua inscrição no CNPJ por dez anos, exceto se for de boa-fé.
O marco estabelece uma série de infrações que poderão ser aplicadas pela ANTT. As punições serão empregadas na forma de penalidades ou medidas administrativas, que vão desde advertência e multa até suspensão do registro, retenção ou remoção do veículo e transferência de carga.
A proposta aumenta ainda a pontuação máxima acumulada na carteira para que o motorista tenha o direito de dirigir suspenso. Atualmente, regra geral na legislação define o máximo de 20 pontos em multas ao longo de 12 meses. Já o marco estabelece que a suspensão somente ocorrerá quando for atingido 25 pontos com até duas infrações gravíssimas; 30 pontos se tiver apenas uma gravíssima; 35 pontos sem infração gravíssima; e 40 pontos sem infração grave ou gravíssima.
O substitutivo de Nelson Marquezelli garante a mudança na pontuação máxima permitida para todo condutor que exerça atividade remunerada em veículo no exercício da profissão. Deste modo, a definição vale, por exemplo, para taxistas, motoristas de aplicativos e de vans e ônibus escolares.
Uma inovação trazida pelo marco consiste na criação do Plano Nacional de Renovação de Veículos de Transporte Rodoviário de Cargas (PNRV-TRC), que funcionará por meio da concessão de créditos de carbono para a adoção de veículos que poluam menos, além de
benefícios para a reciclagem de caminhões. A intenção é melhorar a segurança viária garantindo a renovação de veículos com idade máxima atingida e a sustentabilidade do meio ambiente.
Para o transportador autônomo, a pequena empresa transportadora e a cooperativa de transporte que aderirem ao plano de renovação, o projeto concede alíquota zero de PIS/Pasep, da Cofins e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Em troca, eles deverão entregar seus veículos velhos para reciclagem. O benefício será concedido a cada cinco anos, e será proibida a revenda.
Além disso, todos os veículos de transporte rodoviário de cargas terão sua idade máxima delimitada pela ANTT, segundo critérios definidos no marco.
A idade dos veículos também determinará a periodicidade da inspeção veicular. É obrigatória a inspeção de caminhões e equipamentos de carga anualmente para aqueles com 10 anos ou mais de fabricação e a cada 2 anos para os com menos de 10 anos. Para os com até 3 anos de idade, a inspeção será dispensada.
No caso de veículos de transporte de produtos perigosos, a inspeção deverá ser anual. Para esse tipo de transporte, os veículos deverão ter até 15 anos e as carrocerias (implementos, reboques, semirreboques e caixas de carga) até 20 anos. As regras para o transporte internacional também são diferentes, sendo 20 anos para os veículos e 25 anos para as carrocerias.
Os proprietários terão 10 anos, a partir da publicação da futura lei, para se adequar à exigência. Depois desse período, a idade máxima dos veículos que realizam transporte internacional será reduzida anualmente em 1 ano, até atingir 15 anos.
Artur Hugen, com Agência Câmara Notícias/Fotos: Divulgação/Arte/Câmara
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19 de Novembro, 2024 às 23:56