Por Henrique Córdova
Estive no mundo político por 35 anos. Durante esse tempo, convivi com parte da imprensa e convenci-me de que ela é capaz de criar um mundo irreal. Nela encontrei jornalistas sérios, preocupados em levar a fiel versão dos fatos a leitores e ouvintes.
Encontrei, também, aqueles ávidos de transmitir, através de pretensos fatos, suas próprias opiniões e ideias, atribuindo-as a seus entrevistados. Não faltaram os que procuravam induzir os seus interlocutores a dizer o que eles, os jornalistas, pensavam.
Não poucos publicavam entrevistas que nunca aconteceram. É forçoso dizer que, apesar de todas as circunstâncias elencadas e outras aleatórias, os jornalistas, via de regra, exerciam a sua profissão com elegância e arte.
Raramente se colocavam no proscênio do teatro, lugar que reservavam para seus interlocutores. Respeitavam os que lhes forneciam matérias e lhes agradeciam a atenção.
Preparavam-se para entrevistar os versados em ciência política e para confrontarem-na com os fatos. Eram inteligentes e de cultura apreciável. Eram humildes, sem abrir mão da dignidade pessoal e da profissão.
Seu maior empenho era o de informar os leitores a respeito de fatos inseridos em contextos temáticos atinentes à realidade dos setores que cobriam. Nada mais. Aos leitores, acreditavam, cabia a interpretação dos fatos descritos com palavras próprias, simples e inteligíveis.
Hoje, grande parte dos jornalistas se transformou em protagonista de peças escritas pelos donos das empresas às quais servem. Os entrevistados não passam de objetos manipuláveis a seu gosto.
São agressivos e soberbos. Alheios à humanidade e filiados a preconceitos ideológicos. Postam-se como se fossem os donos incontestáveis da verdade e não respeitam seus interlocutores. No tablado das ideias e das palavras querem nocautear seus entrevistados.
Ao disporem da mídia, ainda que setorialmente, fazem proselitismo e intentam desmoralizar quem não segue seu itinerário ideológico. Outros, alheios aos fatos, só promovem quem e o que lhes interessa pecuniariamente. Quase todos hipotecam a ética à orientação dos donos, ou chefes, dos veículos de comunicação.
É exemplar, no caso, o episódio ocorrido, à véspera de um Natal, com o talentoso e boêmio jornalista Alceu Guanabara. Ele saía da redação do jornal em que trabalhava, quando o editor-chefe o interceptou e disse:
Alceu, parou, virou-se para o editor e perguntou:
Descrevo o episódio para mostrar, no caso, a dependência do jornalista à linha ideológica e à vontade do dono do veículo em que atuava, bem como o seu descompromisso com a verdade histórica aceita como tal.
É indiscutível que os meios de comunicação se constituem em empresas comerciais, cujo objetivo é vender informações que interessam aos seus destinatários e compradores.
O seu sucesso depende da qualidade, pureza e ocasião da oferta das mercadorias. Há empresas que, em função de contratos publicitários firmados, ou não, com governos, a eles e aos seus interesses, se subordinam, ou não. Tudo passa a depender das verbas e de suas quantidades oferecidas e recebidas.
No Brasil, uma grande empresa de comunicação social já apoiou governos militares e, depois, fez o mesmo com os seus adversários, quando estes assumiram o poder…. Essas mudanças decorreram da percepção de quinhões polpudos de recursos públicos.
Em resumo, o critério para a seleção e modo de apresentação dos fatos ao público reside, não na realidade do contexto geral vivido e regulado por valores universais, mas no dinheiro… E, assim, nasce um mundo ficcional gerado nas entranhas da ganância, que nos engole e que nos separa da realidade, sem a generosidade de regurgitar-nos.
É uma tragédia burlescamente vestida
19 de Novembro, 2024 às 23:56