Se você é daqueles que pensa que o agronegócio está aniquilando nossa fauna nativa, tudo sendo envenenado com agrotóxicos, deveria ir conversar com o Cido, no pesque-pague JJ, em Araras. Estive lá neste Dia das Mães.
Ele perdeu nos últimos meses cerca de 50 galinhas caipiras, criadas soltas entre os tanques da piscicultura, comidas por cachorros do mato e por uma onça jaguatirica. Tais predadores haviam desaparecido, mas ressurgiram por aquelas bandas. Incrível.
No bairro do São Bento, que fica ali perto, entre os municípios de Araras e Leme, os sitiantes também passaram a recolher seus galináceos, cabritos e animais domésticos que costumavam varar a noite passeando no quintal. Doravante, toda a bicharada dorme presa. Senão, não sobra um vivo.
É inacreditável. Animais silvestres, incluindo mamíferos de porte, reaparecem vivendo amparados pelo mar de cana que se instalou na agricultura paulista. Eles contam com a ajuda das matas ciliares, aquelas na beirada dos córregos, para se esconderem, beberem água e se alimentarem.
Denominadas pelo Código Florestal de Áreas de Preservação Permanente (APPs), essas margens de proteção dos recursos hídricos se recuperam rapidamente nas propriedades rurais. Pássaros canoros e grandes aves, como tucanos e jacus, que haviam sumido, voltaram a voar no espaço rural.
A presença e o crescimento populacional dos animais silvestres em ambientes modificados pela agropecuária tem sido relatada por vários estudos científicos. Na Embrapa – Monitoramento por Satélite, situada em Campinas, o pesquisador José Roberto Miranda lidera tais estudos, realizados há mais de 20 anos.
Suas câmeras de monitoramento detectaram 340 espécies de vertebrados vivendo entre os canaviais da região. São tamanduás, lagartos teiús, veados-mateiros, lobos-guarás, jaguatiricas, bandos de macacos-prego e, a mais imponente, a onça-parda.
Somente uma hipótese explica esse maravilhoso fenômeno: afora o trabalho de fiscalização ambiental, tais animais silvestres têm, surpreendentemente, encontrado alimento farto e boas condições de cria, dentro das zonas canavieiras. Um ambiente saudável.
Da janela de meu escritório, situado no centro da capital paulista, avisto com frequência um gavião carcará, pousado na antena de TV do prédio vizinho à espreita de sua presa. No quarteirão ao lado, um casal de papagaios de papo amarelo se diverte gritando nas árvores do jardim do Clube Inglês. Supimpa.
Tais informações, animadoras, se chocam com o pensamento catastrófico típico do ecologismo nacional. A força humana modifica a natureza, não a destrói necessariamente. A capacidade de adaptação das espécies vivas é fantástica, muito maior que se imaginava.
Na Suécia, discute-se há décadas como manter um equilíbrio saudável entre a fauna nativa e a criação de ovelhas. O que é mais importante, se questiona por lá: proteger os lobos ou cuidar dos rebanhos?
Saber que a onça come a galinha do Cido não pode induzir ao desleixo ambiental. Deve, isso sim, servir de aprendizado, de estímulo ao trabalho de proteção ecológica. Mas agora sob novo prisma: ser realizado em conjunto com a produção rural. Jamais contrário ao agricultor. Afinal, ele gosta de ver suas galinhas ciscarem em paz.
Xico Graciano/Poder 360/Foto: Amanda Lelis/Instituto Miramauá
19 de Novembro, 2024 às 23:56