A Câmara dos Deputados concluiu a votação do projeto que impõe travas para o crescimento de despesas com pessoal e para incentivos tributários, se houver déficit primário. O texto também permite o uso de superávit de quatro fundos para pagar a dívida pública por seis anos (2025 a 2030). A proposta será enviada ao Senado.
De autoria do deputado José Guimarães (PT-CE), o Projeto de Lei Complementar (PLP) 210/24 faz parte do pacote de corte de gastos do governo para tentar cumprir a meta fiscal de 2025 em diante.
A proposta foi aprovada nesta quarta-feira (18) com substitutivo do relator, deputado Átila Lira (PP-PI). Ele incluiu no texto a revogação da Lei Complementar 207/24, de maio deste ano, que recriou o seguro obrigatório de veículos automotores (SPVAT, antigo DPVAT).
A revogação foi anunciada após acordo com o governo. "Pacificamos uma orientação fundamental para unificar o Plenário. Volta ao texto o cancelamento do DPVAT", disse José Guimarães, que é autor do projeto e líder do governo.
Nesta quarta-feira, o Plenário da Câmara precisava concluir a votação dos destaques apresentados pelos partidos na tentativa de mudar trechos do projeto.
Antes dessa votação, Guimarães anunciou um acordo entre as lideranças partidárias em torno de uma emenda aprovada e incorporada ao texto limitando o contingenciamento e o bloqueio de emendas parlamentares àquelas não impositivas (R$ 11,5 bilhões de emendas de comissão), deixando de fora do contingenciamento e do bloqueio as emendas individuais (R$ 24,67 bilhões) e de bancada (R$ 14,68 bilhões), um total de R$ 39,35 bilhões.
Com a aprovação da emenda, evitou-se a votação de destaque do PL que pretendia excluir do texto a regra de contingenciamento e bloqueio de qualquer emenda parlamentar.
Limite de 15%
O texto aprovado retoma proposta que não virou lei no projeto sobre emendas parlamentares (Lei Complementar 210/24), determinando que serão aplicados às emendas não impositivas o contingenciamento e o bloqueio até a mesma proporção aplicada às demais despesas discricionárias.
Essa lei surgiu depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter cobrado maior transparência na execução de emendas, mas o bloqueio ficou de fora. Agora, no entanto, apesar de voltar o bloqueio, tanto ele quanto o contingenciamento serão limitados a 15% das dotações de emendas de comissão (não impositivas). A Lei Complementar 210/24 não estabelece limite para o contingenciamento e não faz distinção entre as impositivas e não impositivas.
O bloqueio de recursos é realizado para cumprir o limite de despesas estabelecido pelo arcabouço fiscal e pode implicar o cancelamento da despesa se o resultado fiscal pretendido não for alcançado.
Por sua vez, o contingenciamento é realizado para cumprir a meta anual de resultado primário. Nessa caso, há mais chance de a despesa vir a ser executada até o fim do ano.
Incentivo tributário
De acordo com o texto, quando ocorrer déficit primário do governo central (conceito que reúne contas do Tesouro Nacional, da Previdência Social e do Banco Central) no ano seguinte em que ele for apurado, a União não poderá publicar lei concedendo, ampliando ou prorrogando incentivo tributário até a conseguir superávit primário em algum exercício seguinte. A regra valerá para 2025 em diante.
Uma vez obtido superávit, o Orçamento do ano posterior não terá mais a trava, que será repetida a cada vez que o governo não conseguir fechar as contas pelo menos no zero a zero (sem déficit) ou com superávit.
Proibição semelhante será aplicada para despesas de pessoal e seus encargos, mas somente até 2030. Se houver déficit, tanto o projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) quanto a própria lei dele derivada não poderão apresentar crescimento anual real maior que 0,6% em relação ao montante do ano anterior, exceto os valores concedidos por causa de sentença judicial.
Essa trava das despesas de pessoal valerá para cada um dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) e também para o Ministério Público da União, a Defensoria Pública da União, o Conselho Nacional do Ministério Público, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Tribunal de Contas da União (TCU).
Benefícios do INS
O projeto deixa dentro das regras do arcabouço fiscal o crescimento anual de despesas com criação ou prorrogação de benefícios da seguridade social (aposentadorias, auxílio-doença e outros). Assim, elas poderão ter crescimento real de, no máximo, 2,5% acima do IPCA.
As despesas do INSS são corrigidas pelo INPC, mas o salário mínimo, usado como base para aposentadorias desse valor e outros benefícios, segue correção real equivalente à variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes.
Como a limitação se refere à criação ou prorrogação de benefícios, a tendência é haver um represamento de concessão se os limites forem atingidos.
Ao impor a regra do arcabouço fiscal a esse tipo de despesa obrigatória, não deve ser seguido apenas o limite máximo de 2,5% da despesa.
A Lei Complementar 200/23 prevê que a despesa primária poderá crescer o equivalente a 70% da variação real da receita primária se o governo cumprir a meta de resultado primário de dois anos antes. O percentual diminui para 50% se a meta não for cumprida.
Assim, a criação ou prorrogação dos benefícios do INSS terá de seguir esses outros limites anualmente.
Crédito compensado
O relator retirou do texto, entretanto, limites para as empresas compensarem créditos apurados com tributos federais. Recentemente, o Congresso Nacional aprovou a Lei 14.873/24, de teor semelhante. A novidade no projeto era a diferenciação do limite por tipo de crédito, que não existe na portaria da Receita Federal sobre o tema.
Desde 2021, o governo federal tem sido obrigado a compensar créditos tributários de PIS/Cofins por causa da chamada “tese do século”. Em decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), as empresas ganharam o direito de retirar o ICMS (tributo estadual) da base de cálculo dessas contribuições. A estimativa do governo é de créditos a pagar aos contribuintes em torno de R$ 1 trilhão em cinco anos, relativos ao passivo em disputa desde 2017.
Redução de despesas
O projeto de lei complementar pretende ainda evitar o aumento de gastos com pessoal e incentivos tributários se as chamadas despesas discricionárias tiverem redução nominal de um ano para outro.
Discricionárias são as despesas que o governo pode decidir não executar e que são passíveis de bloqueio ou contingenciamento, como investimentos, compra de equipamentos, insumos, execução de serviços (passaportes, por exemplo), pagamento de bolsas de pesquisa.
O valor total dessa categoria de despesa caiu de R$ 188,1 bilhões em termos reais em 2016 para R$ 133,5 bilhões em 2021.
Assim, a partir do projeto de Lei Orçamentária de 2027, que é formatado em 2026, se as despesas discricionárias de 2025 tiverem execução menor que as de 2024, em 2027 não poderá ser publicada lei que conceda, amplie ou prorrogue incentivo ou benefício de natureza tributária.
De igual maneira, o Orçamento de 2027 não poderá conter crescimento anual real de despesa de pessoal e encargos acima de 0,6%, excluídos os valores concedidos por sentença judicial.
Essas restrições serão usadas até o ano em que as despesas discricionárias totais voltem a ter crescimento nominal em relação ao ano anterior. Se voltar a ter déficit, elas são aplicadas novamente.
Dinheiro de fundos
Por seis anos, entre 2025 e 2030, se houver superávit financeiro em fundos listados pelo PLP 210/24, em vez de essa sobra ser alocada em favor do próprio fundo no ano seguinte, ela poderá ser usada livremente pelo governo (para as despesas discricionárias, por exemplo).
No texto original, havia mais três fundos cujos recursos poderiam ser utilizados para essa finalidade, mas eles foram excluídos pelo relator em seu parecer aprovado: Fundo Nacional Antidrogas (Funad), Fundo da Marinha Mercante (FMM) e Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC).
Dessa forma, apenas outros cinco fundos terão o superávit usado para pagar a dívida:
Fonte: Agência Câmara de Notícias – Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados – postado por jornalista Artur Hugen
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